Metodologia ativa x aula expositiva: é possível dizer que uma é melhor que a outra?

2018-08-02T09:46:31-03:00 02/08/2018|

Estudo com alunos de Medicina sugere que metodologia ativa interfere na capacidade de aplicar o conhecimento para a solução de problemas

Por Priscilla Albuquerque Tavares, para a coluna Pesquisa Aplicada, parceria de Iede e Nova Escola 

No artigo “Metodologias ativas: entenda como elas favorecem a aprendizagem”, abordamos porque modelos que envolvem projetos em grupo, gamificação e  sala de aula invertida, por exemplo, beneficiariam a aprendizagem. Agora, vêm as questões: é possível de fato medir a efetividade das metodologias ativas em relação às aulas expositivas? Como fazer isso?

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Para assegurar a efetividade de um método de ensino, isto é, afirmar que os alunos aprendem mais porque são submetidos a determinada metodologia e não a outra, seria preciso realizar estudos científicos experimentais que fossem capazes de isolar todos os demais fatores que impactam o aprendizado, para além do método pedagógico empregado. Na área de educação, infelizmente, ainda há poucas pesquisas com elevado rigor científico que produzam resultados confiáveis dos efeitos que os diferentes processos educacionais geram sobre o aluno. Isto porque dificilmente há as condições adequadas para a realização deste tipo de estudo.

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A melhor maneira de verificar os efeitos de metodologias ativas de aprendizagem seria a partir da alocação aleatória (sorteio) de estudantes de uma determinada rede de ensino entre dois grupos: um seria submetido ao método que se quer testar (no caso, a metodologia ativa) e o outro à metodologia expositiva tradicional. O primeiro é chamado de grupo tratamento e o segundo, grupo controle.

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Para citar um exemplo, na Holanda, a seleção dos estudantes para os diferentes cursos de medicina se assemelha a este processo e fornece uma excelente oportunidade para pesquisa: os alunos aprovados em um exame nacional são alocados aleatoriamente nas diferentes escolas de medicina do país, que empregam dois métodos de aprendizagem – tradicional e problem based learning (PBL). Vários estudos aproveitam essa oportunidade para avaliar o PBL em diferentes dimensões.

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A primeira delas é o grau de conhecimento dos estudantes sobre os conteúdos curriculares de disciplinas básicas do curso de medicina, medido por testes padronizados de proficiência. Neste caso, não parece haver diferenças entre alunos egressos de escolas convencionais e de escolas que utilizam o PBL. Outra dimensão refere-se ao uso do conhecimento adquirido para uma aplicação prática ou resolução de um caso clínico. Nos testes que avaliam as habilidades de investigação de diagnósticos, condução de exames clínicos abdominais e emprego de técnicas de ressuscitação, os residentes vindos de escolas de medicina que empregam o PBL obtiveram melhores resultados do que os que se formaram em escolas tradicionais.

Esses resultados sugerem que, embora o ambiente ativo de aprendizagem não aumente a quantidade de informação aprendida, ele parece favorecer a qualidadedo uso desta informação, na medida em que interfere na capacidade do aluno de utilizar os conhecimentos de forma integrada e de aplicá-los satisfatoriamente para a solução de problemas concretos.

Em outros estudos, não se encontram efeitos significativos do PBL sobre o aprendizado. Alguns autores argumentam que o modelo de estudo adotado interferiria no resultado: o número de alunos em sala de aula e os mecanismos de avaliação dos estudantes seriam elementos-chave para o sucesso e, neste sentido, um modelo de ensino mal desenhado poderia levar a metodologia ativa a ter resultados inferiores aos obtidos pelo método expositivo tradicional.

De fato, os resultados da avaliação de uma metodologia em particular incluem os efeitos de todos os elementos que a caracterizam. Diante da grande heterogeneidade entre os modelos de aprendizagem ativa existentes, é preciso que se realizem ainda muitos estudos científicos que adotem metodologias de avaliação críveis e, portanto, que sejam capazes de medir rigorosamente os impactos sobre a aquisição de conhecimento e habilidades. Mais do que isso, é preciso investigar quais são os mecanismos por trás destas metodologias ativas que seriam capazes de gerar resultados positivos para os alunos.

Para saber mais:

Duch, B. J., Groh, S. E., Allen, D. E. (2001). The power of problem-based learning: a practical “how to” for teaching undergraduate courses in any discipline. Sterling, Virginia.

Godden, D., & Baddeley, A. (1975). Context-dependent memory in two natural environments: On land and underwater. British Journal of Psychology, 66, 325-332.

Newell, A., & Simon, H. A. (1972). Human problem solving. Englewood Cliffs, NJ: Prentice Hall.

Remmen, R., Derese, A., Scherpbier, A., Denekens, J., Hermann, I., van der Vleuten, C. (1999). Can medical schools rely on clerkshipd to train studentes in basic clinical skills? Medical Education 33, 600-5.

Remmen, R., Scherpbier, A., van der Vleuten, C., Denekens, J., Derese, A., Hermann, I. (2001). Effectiveness of basic clinical skills training programmes: a cross-sectional comparison o four medical schools. Medical Education 35, 121-8.

Scherpbier, A. J. J. A. (1997). The quality of skills training assessed. Maastricht Universtity, Maastricht, the Netherlands.

van Berkel, H., Scherpbier, A., Hillen, H., van der Vleuten, C. (2010). Lessons from Problem Based Learning. Oxford University Press.

Priscilla Albuquerque Tavares é doutora em Economia pela Fundação Getulio Vargas (FGV), Mestre e Bacharel em Economia pela Universidade de São Paulo (USP). É professora da Escola de Economia de São Paulo, da FGV, pesquisadora na área de Economia da Educação e autora de diversos artigos que avaliam impactos de políticas educacionais no Brasil.

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