Evento de 10 anos do QEdu traz dados inéditos sobre a aprendizagem dos estudantes e debate desafios da educação

2023-04-25T17:17:32-03:00 02/12/2022|

Apenas 5% dos estudantes do Ensino Médio da rede pública têm aprendizado adequado em Matemática, de acordo com dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) 2021, tabulados pelo Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) e disponíveis na plataforma QEdu.

As novas informações sobre a aprendizagem dos estudantes foram divulgadas na quarta-feira (30/11), durante evento de 10 anos do QEdu. Criado em 2012 pela Fundação Lemann em parceria com a Meritt, o QEdu é de gestão do Iede desde 2020. 

A situação de aprendizagem se agravou com a pandemia, mas os dados – que podem ser consultados no QEdu por ano, estado e rede de ensino – mostram que o problema é anterior a ela: em 2019, a percentagem era 7%.

“Havia a expectativa de que a melhora nos resultados de aprendizagem do Ensino Fundamental se refletisse, ao longo dos anos, no Ensino Médio, mas isso não aconteceu”, analisa Ernesto Faria, diretor-fundador do Iede, na palestra de abertura do evento.

Em Língua Portuguesa, a situação é um pouco melhor, mas, ainda assim, muito longe da ideal: 31,3% dos alunos do Ensino Médio da rede pública têm aprendizado adequado. Em 2019, eles somavam 34%. Em sua fala, Ernesto ainda chamou a atenção para a enorme desigualdade de aprendizagem entre estudantes de diferentes níveis socioeconômicos e para a necessidade de olhar também para questões de cor/raça ao analisar os dados.

Panorama da educação pública

A palestra de abertura, que foi transmitida ao vivo do Canal Futura (assista aqui), contou com a participação de José Francisco Soares, professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e ex-presidente do Inep. Ele ressaltou a importância de acompanhar os dados de aprendizagem: “o QEdu tornou esse monitoramento acessível a todos. Agora, devemos apontar o dever do Estado de garantir a concretização do direito à educação.” O professor ainda criticou o atual cálculo do Ideb, considerado “muito leniente com os estudantes que estão fora da escola” e defendeu a importância do trabalho em tempo integral e em uma só escola para os professores. 

Olavo Nogueira, diretor executivo do movimento Todos Pela Educação, que também participou do evento, apontou alguns dos principais desafios para o próximo ano: reconstrução do MEC e do pacto federativo na educação, medidas estruturais para fortalecer os sistemas educacionais e ações emergenciais para enfrentar os efeitos da pandemia.

“Ainda enfrentamos os impactos desse momento e faltam ações, hoje, para combatê-los. São necessárias medidas de combate ao abandono e evasão, de recuperação da aprendizagem, de garantia da segurança alimentar e de apoio à saúde mental de estudantes e profissionais da educação”, defende Olavo Nogueira. 

Apesar dos desafios citados, ele acredita que o próximo governo enfrentará uma situação melhor que a de 2003, quando Lula assumiu seu primeiro mandato. Isso porque o Brasil atual teve avanços importantes na organização curricular, no financiamento educacional e dos sistemas de ensino. 

Ensino técnico e apoio pedagógico

A plataforma QEdu também inaugura uma nova seção, que reúne dados do Ensino Técnico e Profissionalizante das redes municipais e estaduais do País (acesse aqui). Na navegação, além de dados sobre o número de escolas, alunos matriculados e professores de cada rede, é possível comparar a distribuição dessas escolas em um estado ou região.

Outra novidade é o lançamento da página Iede Pedagógico, que ajuda professores a entender o quanto as questões de suas provas realmente contribuem para avaliar a aprendizagem dos estudantes. Para isso, é preciso fazer um cadastro gratuito na página e tabular os dados do exame aplicado. Por meio de gráficos e tabelas, o sistema ajuda o docente a perceber: a complexidade de sua prova, a dificuldade de cada questão em comparação com a aprendizagem dos alunos e os distratores (acertos que não correspondem ao nível de proficiência do estudante e podem ser fruto de um ‘chute’ ou ‘cola’), além de ampliar sua compreensão sobre quais dúvidas os estudantes apresentam naquela habilidade.

Com essas informações, professores e gestores conseguem visualizar o nível de aprendizagem dos estudantes e melhorar seu planejamento pedagógico. “O Iede Pedagógico ajuda o professor a entender se a prova conseguiu identificar a diferença de aprendizagem que existe entre os alunos”, explica Ernesto. Ele ainda conta que o Iede realizará cursos para orientar os professores sobre a utilização da ferramenta. 

Aprendizagem em Matemática e desigualdades educacionais

O evento de 10 anos do QEdu contou com painéis de discussão sobre os seguintes temas: acesso e permanência na escola, profissionalização da gestão educacional, desigualdades na educação e baixos índices de aprendizagem em Matemática. Na mesa sobre os desafios para o ensino dessa disciplina, Karina Daidone, gerente de projetos sociais da Fundação Telefônica Vivo, falou sobre a importância do preparo qualificado dos educadores e do uso de recursos digitais com intencionalidade. Ela também contou sobre o projeto PróFuturo, que reúne pesquisa e ações pedagógicas voltadas para o aprendizado de Matemática e é desenvolvido em parceria com o Grupo Mathema.

“Ao analisar as questões de matemática em que os alunos mais têm dificuldades, vemos que são as que envolvem conhecimentos que deveriam ter sido construídos desde os anos iniciais do Ensino Fundamental”, analisou o professor Jorge Lira, Cientista-Chefe da Educação no Estado do Ceará e coordenador do Centro de Excelência em Políticas Educacionais da Universidade Federal do Ceará (UFC). 

Para ele, a falta de uma base sólida se acumula ao longo dos anos e acaba refletindo nos baixos índices de aprendizagem na área.

Na mesa sobre desigualdades na educação, Fernanda Patriota, diretora executiva do Instituto Gesto, falou sobre a importância da gestão olhar para a equidade racial e contou sobre o trabalho do instituto no apoio pedagógico e administrativo aos gestores públicos. Já Marisa Costa, consultora de políticas educacionais e doutoranda em educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), propôs uma reflexão sobre identidade racial e o papel da escola nesse reconhecimento do estudante. “O Brasil é diverso, mas não inclusivo”, afirma. Nas palavras de Chico Soares, que também participou da mesa: “qualidade para poucos não é qualidade”. 

Gestão, acesso e permanência

Na discussão sobre profissionalização da gestão, Márcia Bernardes, presidente da Undime São Paulo, ressaltou o papel do diretor escolar no acompanhamento da aprendizagem dos estudantes. “Isso só pode acontecer com acesso a esses dados. No questionário do Saeb, a maioria afirma levar em consideração essas informações, mas o que fazem com elas? Como analisam?”, provoca. Ela lembra que até o trabalho de coordenação do Projeto Político Pedagógico deve considerar o que apontam os dados educacionais.

Raph Gomes, que é consultor de políticas públicas de educação e foi superintendente de educação nas redes estaduais de Goiás e Paraná, falou sobre como muito projetos paralelos acabam distraindo os gestores de suas principais ações: “a escola precisa ter rotina e previsibilidade. É preciso fazer primeiro o básico, o feijão com arroz”, defende.

Na mesa sobre acesso e permanência, Julia Ribeiro, oficial de educação do UNICEF Brasil, falou sobre o programa busca ativa escolar e a complexidade de motivos que envolvem o abandono e a evasão. Ela explica que o desinteresse pela escola, por exemplo, pode ser reflexo de diversas questões diferentes, como problemas com bullying, racismo e dificuldades de aprendizagem. Leonardo Rosa, pesquisador do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), também falou sobre como a evasão deve ser encarada de forma multifatorial, já que está associada a questões como saúde mental, engajamento escolar e relações sociais. Ele acredita que algoritmos bem estruturados podem ser uma ferramenta importante de combate ao problema, ao indicar onde há mais fatores associados à evasão.

O debate ainda contou com a participação de Cezar Colares, do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) do Pará, que falou sobre os desafios da educação nos municípios da Ilha de Marajó. “Cerca de 70% dos estudantes da região não tiveram nenhuma atividade escolar durante a pandemia. Atividades on-line não houve nenhuma, já que o acesso à Internet é muito baixo entre a população e até nas escolas”, diz.

Luiz Miguel Martins Garcia, presidente da Undime nacional, falou sobre a importância do trabalho colaborativo dos entes federativos.

“As políticas públicas educacionais devem ser construídas e implementadas em regime de colaboração entre todas as partes, e com toda a comunidade escolar envolvida. Toda a rede precisa ter consciência da importância do currículo, dos projetos políticos, do processo de formação inicial e continuada de professores, da avaliação diagnóstica, recursos didáticos, entre tantas outras coisas, para termos uma educação integral de qualidade”, diz Luiz Miguel Garcia. 

Repercussão na imprensa

Os novos dados sobre aprendizagem dos estudantes, tabulados pelo Iede para o QEdu, foram destaque na cobertura da imprensa nacional. O tema foi a principal notícia do caderno Cotidiano da Folha de S. Paulo e foi abordado também pelo jornal O Globo, pela CNN Brasil e pela TV Cultura. Já o ES Hoje destacou os resultados do Espírito Santo, duas vezes maiores que a média nacional, na aprendizagem de matemática. O Valor Econômico focou sua reportagem no melhor desempenho dos estudantes de Ensino Médio com formação técnica. Além dos dados, a TV Globo, no programa SP1, também destacou o seminário em si, que reuniu educadores, gestores e líderes de organizações do 3º setor para debater educação. 

As principais notícias publicadas sobre o evento na imprensa estão disponíveis no Iede na Mídia.